O estresse emocional provocado por inúmeros agentes estressores presentes nos ambientes urbanos é considerado importante fator de risco para doenças cardiovasculares. E o risco aumenta quando o estresse é associado a outros fatores, como o sedentarismo e a obesidade. O problema afeta não apenas as pessoas que moram nas grandes cidades, mas também seus animais de estimação. O alerta está no artigo publicado pela revista Physiology & Behavior, de autoria de Carina Cunha Silva, doutoranda do Programa de Pós-graduação em Fisiologia e Farmacologia, do Instituto de Ciências Biológicas (ICB).
A pesquisadora, que também é médica veterinária, observa que a companhia de animais de estimação é indicada como terapia não farmacológica eficiente, para atenuar os efeitos do estresse, da ansiedade e reduzir o risco de doença cardiovascular nos tutores. Mas, segundo ela, os efeitos do estresse agudo e crônico sobre a saúde cardiovascular dos animais domésticos ainda não têm recebido a atenção devida.
O artigo, originado de revisão bibliográfica sobre o tema, alerta sobre os riscos a que esses animais estão expostos. Segundo Carina, muitas vezes, as situações de estresse têm início dentro de casa, com a sensação de isolamento, a exposição a ruídos, como buzinas e alarmes, presença de pessoas estranhas, restrição de espaço e temperatura inadequada e, até mesmo, a exposição a ambientes com os quais os animais não estão habituados. Sedentarismo e obesidade também aumentam os riscos de doenças cardiovasculares nos animais, principalmente quando associados a condições de estresse.
Carina Cunha explica que a introdução de animais de estimação nas grandes cidades ocorreu após a Primeira Guerra Mundial. “Isso significa que, em um único século, humanos e animais começaram a enfrentar estressores novos e frequentes para os quais nossa fisiologia provavelmente não estava preparada. E, independentemente do contexto, esses estressores podem ser experimentados por qualquer animal como uma ameaça”, observa.
A médica veterinária explica que, diante do estresse emocional, ocorrem alterações neuroendócrinas, autonômicas e comportamentais. Os estímulos estressores ativam as vias sensoriais, que levam informações para o sistema nervoso central. A amígdala, uma das principais áreas ativadas, envia projeções para o hipotálamo dorsomedial que, por meio de outros núcleos, aumenta o tônus simpático cardíaco e vasomotor, resultando em elevação de frequência cardíaca, força de contração do coração, pressão arterial e temperatura corporal. Também provoca redistribuição do fluxo sanguíneo.
Essas alterações facilitam respostas rápidas e estratégicas (luta ou fuga) a fim de ampliar as chances de sobrevivência do indivíduo. No entanto, estímulos frequentes e de longa duração podem acarretar aumento sustentado do tônus simpático, predispondo ao desenvolvimento de doenças cardiovasculares, como arritmias, hipertensão, hipertrofia do coração, coagulopatias, infarto do miocárdio e, em casos extremos, morte súbita.
Sinais
Carina Cunha chama a atenção para os sinais comportamentais – mais comumente estudados e também identificados pelos proprietários de animais domésticos – e para os sinais invisíveis, que podem indicar alterações cardiovasculares. “No consultório veterinário, é muito comum ouvir relatos sobre mudanças de comportamento dos pets, como respiração ofegante, agitação, choro, latidos frequentes ou hábito de morder os móveis da casa”, relata. Esses sinais, que podem indicar estresse emocional, devem ser avaliados juntamente com o exame clínico e exames complementares, como eletro e ecocardiograma, capazes de diagnosticar as alterações cardiovasculares.
A pesquisadora destaca ainda que a constante tentativa de adaptação dos animais domésticos ao ambiente urbano depende de variáveis como tempo, frequência e tipo do agente estressor a que são expostos. A peculiaridade de cada raça também deve ser considerada. “Em raças propensas à obesidade, devido à menor capacidade de dissipação e tolerância ao calor, a exposição ao estresse pode ser ainda mais grave, já que, durante o estresse, ocorre o aumento da temperatura corporal, o que contribui para sobrecarga do organismo desses animais”, adverte.
Como é difícil eliminar os agentes estressores em ambientes urbanos, a médica veterinária recomenda algumas medidas para atenuá-los, como adaptação do ambiente, prática de atividades físicas, programas de dessensibilização que mudam as associações com os estímulos estressores e reeducação dos pets e de seus tutores. A maior interação entre os tutores e os animais favorece a redução da ansiedade e possibilita identificar mais facilmente as necessidades dos pets.
Segundo Carina Cunha, os tratamentos farmacológicos são recomendados em casos extremos de ansiedade ou para tratar doenças cardiovasculares já estabelecidas e devem ser associados ao tratamento não farmacológico para alcançar resultados melhores.
Artigo: Cardiovascular reactivity to emotional stress: The hidden challenge for pets in the urbanized environment
Autora: Carina Cunha Silva
Revista Physiology & Behavior, Volume 207 / 1º de agosto
Por Teresa Sanches | Portal da Universidade de Minas Gerais.